Fala de Bolsonaro sobre Forças Armadas foi inadequada, diz pesquisador SVG: calendario Publicada em
SVG: atualizacao Atualizada em 11/03/19 16h07m
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Historiador afirma que discurso do Presidente não surpreende em função de seu histórico antidemocrático

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Dockhorn: constante menção de que o presidente é mal interpretado permite pensar que problema está no emissor

“Democracia existe só se as Forças Armadas quiserem”. A frase foi proferida pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), em solenidade militar, na última quinta, 7 de março. A expressão causou grande impacto e foi analisada, a pedido da assessoria de imprensa da Sedufsm, pelo professor da UFSM, Gilvan Dockhorn, historiador que pesquisa há 22 anos o tema “Golpe civil-militar de 1964”. Para o docente, “não surpreende que o presidente faça um discurso com esse conteúdo”. No entendimento dele, a trajetória política do deputado e também do candidato à Presidência, nunca se pautou pelo apreço às instituições democráticas, tendo em vista suas inúmeras declarações defendendo o processo de ditadura militar e os elogios a famosos torturadores do país (e do exterior, como foi o caso de frases elogiosas ao ditador paraguaio, Alfredo Stroessner).

Na visão do historiador, a fala do Presidente, na última quinta-feira, indica “uma alusão a uma suposta concessão aos civis por parte da oficialidade militar”. Para Gilvan Dockhorn,  “a oficialidade militar não é uma elite autônoma, está inserida nos interesses e disputas sociais e toma posições conforme os interesses das elites”. E acrescenta: “Não creio que haja um contexto para uma ocupação militar do poder por mecanismos não democráticos e nem mesmo que a instituição tenha tal poder ou até mesmo interesse.”

Questionado sobre as declarações do vice-presidente, general Hamilton Mourão, entre outros militares próximos a Bolsonaro, de que houve um problema de “interpretação” na fala do Presidente, o professor da UFSM analisa que “a constante menção de que o presidente é mal interpretado permite pensar que o problema está no emissor que não se faz entender”. Conforme Dockhorn, “não é a primeira vez (e creio que não será a última) que Mourão vem a público para intermediar falas do presidente e equipe de governo”. E assinala: “Mourão, bem assessorado que, é e já antevendo cenários políticos futuros, sabe que o equilíbrio e estabilidade do governo dependem também de habilidade do governante em não fomentar a radicalização polarizada e fragmentada da sociedade, algo que o presidente, seus filhos e grande parte da equipe ministerial ignora”.

Confira a seguir a íntegra da entrevista do professor e historiador Gilvan Dockhorn, vinculado ao curso de Gestão em Turismo da UFSM. Na terça, 12 de março, veicularemos entrevista de mesmo teor com o professor do departamento de Ciências Sociais da UFSM, João Rodolpho Flores.

Sedufsm- Como podemos interpretar essa fala do primeiro mandatário da nação? Significa que as instituições são reféns dos militares?

Gilvan Dockhorn- Não surpreende que o presidente faça um discurso com esse conteúdo. Creio que a surpresa seria o presidente ter proferido um discurso sensato, articulado e ponderado.

Ao eleger não apenas a figura de Bolsonaro, mas toda uma proposta genérica de governo e de política que se pautava mais pelos "antis" (antipetismo, anticorrupção, antipolítica tradicional, antiviolência e, por incrível que pareça, anticomunismo...) e por um certo desprezo pelas instituições democráticas do que propriamente um programa de governo e de país, tais declarações e posturas dos mandatários atuais são mais do que esperadas.

Na fala do presidente (e em praticamente todo o discurso oficial) há toda uma simbologia nacionalista e a ênfase no suposto poder "moderador" das Forças Armadas (concepção já superada e desconstituída pela produção historiográfica). Essa fala especificamente indica uma alusão a uma suposta concessão aos civis por parte da oficialidade militar. A oficialidade militar não é uma elite autônoma, está inserida nos interesses e disputas sociais e toma posições conforme os interesses das elites. Não creio que haja um contexto para uma ocupação militar do poder por mecanismos não democráticos e nem mesmo que a instituição tenha tal poder ou até mesmo interesse. Foram 14 anos de governos petistas e as Forças Armadas, com discursos isolados de oposição radical, se manteve fiel aos princípios constitucionais. A democracia não é, na atual conjuntura, refém de qualquer instituição, quer as Forças Armadas, quer o Judiciário.

Sedufsm- Como interpretar essa fala em um contexto de país que viveu 20 anos sob regime autoritário, comandando pelos militares?

Gilvan Dockhorn- A fala é inadequada e nada condizente com o sistema democrático. Contudo, a inclinação autoritária e nada democrática do atual presidente foi exposta ao longo de sua inócua carreira política e ganhou enorme dimensão na campanha eleitoral. Defensor que é de práticas que ferem a dignidade humana como a tortura (inclusive elogiando o notório e execrável torturador (Carlos Alberto Brilhante Ustra na votacão pelo impedimento da presidente Dilma), portador de um discurso moralista conservador e de pouco apresso às formulações intelectuais, a constante menção de que a oficialidade militar atuará para preservar uma certa ordem e um certo padrão de costumes, revela mais um desejo e uma concepção de controle irrestrito de poder. Esperava-se que, após os tristes anos da ditadura e da longa transição, o país, a maioria dos eleitores, tivesse maturidade política suficiente para repudiar qualquer menção saudosista desse passado recente e de qualquer discurso que diminua ou coloque em questão as conquistas democráticas.

Sedufsm- O vice, general Hamilton Mourão, afirmou que Bolsonaro foi mal interpretado. Na sua avaliação, cabe alguma outra interpretação?

Gilvan Dockhorn- A constante menção de que o presidente é mal interpretado permite pensar que o problema está no emissor que não se faz entender. Nesse cenário entre o trágico e o cômico, entre o ridículo e o desalentador, surpreende o fato de que a voz mais ponderada do governo seja exatamente a do vice, Mourão. Não apenas Mourão tem sido fundamental no governo, sendo voz dissonante das posturas desequilibradas do presidente e seu staff (incluindo os filhos), faz o papel do verdadeiro estadista, lamentando a saída de Jean Wyllys do país, defendendo o direito individual da mulher na questão do aborto, rechaçando qualquer esdrúxula ideia de intervenção militar na Venezuela e se solidarizando com Lula quando da morte do neto do ex-presidente.

Não é a primeira vez (e creio não será a última) que Mourão vem a público para intermediar falas do presidente e equipe de governo. Mourão, bem assessorado que é e já antevendo cenários políticos futuros, sabe  que o equilíbrio e estabilidade do governo dependem também de habilidade do governante em não fomentar a radicalização polarizada e fragmentada da sociedade, algo que o presidente, seus filhos e grande parte da equipe ministerial ignora.

Texto: Fritz R. Nunes
Foto: Arquivo/Sedufsm

Assessoria de imprensa da Sedufsm

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