Professor rebate IN 65: metas produtivistas ameaçam qualidade de vida SVG: calendario Publicada em 20/08/20 11h46m
SVG: atualizacao Atualizada em 20/08/20 12h06m
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Ministério da Economia divulgou live técnica sobre a Instrução Normativa nº 65, que regulamenta o teletrabalho no serviço público

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O Ministério da Economia realizou uma live na última terça-feira, 18, para apresentar a Instrução Normativa nº 65, que regulamenta o teletrabalho no serviço público. Há alguns dias, já divulgamos trechos de uma análise feita pelo escritório Wagner Advogados Associados e que dá conta de mostrar as principais armadilhas contidas no projeto, a exemplo da fixação de metas que podem gerar sobrecarga, do corte de adicionais e da responsabilização do servidor pelos custos do teletrabalho.

O professor do departamento de Ciências da Saúde da UFSM em Palmeira das Missões, Gianfábio Pimentel Franco, assistiu à live para entender melhor no que consistia a proposta da IN. Ele, contudo, tem profundas ressalvas ao que ouviu. Primeiramente, destaca o caráter da atividade virtual: tratava-se de, praticamente, uma peça publicitária favorável ao governo, na qual se tentava fazer a venda de um produto, o teletrabalho.

Durante a live, que pode ser vista, na íntegra, aqui, a diretora do Departamento de Provimento e Movimentação de Pessoal, Luiza Roland, disse que há hoje no Brasil cerca de 360 mil servidores no trabalho remoto. Na rede federal de educação, 95% dos servidores vêm realizando o trabalho de forma remota. Já nos demais órgãos do governo, essa porcentagem chega a 49%. Franco, contudo, lembra que a divulgação desses números por si só não é indicativo de adesão voluntária de servidores, visto que muitos, com a pandemia, não tiveram outra opção além de se adequarem ao trabalho remoto. “Eles utilizam esses dados porque obviamente manter as pessoas em casa gerou economia para o governo, e isso é interessante paara eles, até porque os servidores acabam perdendo outras coisas”, diz o docente, referindo-se a adicionais que tendem a ser cortados em caso de teletrabalho, a exemplo dos adicionais noturnos, de insalubridade ou de transporte.

“Eles não falam claramente sobre adicionais, mas obviamente eles serão retirados, porque já durante a pandemia vieram instruções normativas orientando que as próprias instituições perguntem se o servidor está em teletrabalho remoto, presencial ou semipresencial. Dependendo do que você marcar, você mantém, diminui ou perde os adicionais”, ressalta Franco.   

Produtividade

Segundo Luiza, a Instrução tem por finalidade potencializar a produtividade; acompanhar as mudanças e inovações; garantir o bom atendimento da população; utilizar de maneira mais eficiente os recursos públicos.

Na prática, a Instrução torna mais fácil a instituição do teletrabalho nos órgãos públicos, deixando ao cargo do dirigente da unidade a formulação das regras específicas para os servidores que desejarem aderir a essa modalidade.

“O trabalho remoto é orientado para resultados. Tem acompanhamento, pelo sistema, das metas. Obrigatoriamente, se você aderir ao teletrabalho, você adere ao sistema de entrega por metas. A gente não tem mais o controle do ambiente físico, mas a gente garante que aquele servidor vai ter metas equivalentes. Nenhuma mudança na meta do servidor pode ser feita sem o conhecimento tanto dele quanto da chefia dele”, afirmou Luiza, complementando que todas as informações das unidades serão enviadas para um portal público que vai ser atualizado semanalmente. Ao servidor que não cumprir as metas estabelecidas, é previsto o desligamento do programa de gestão.

Embora o governo tente conceder à Instrução Normativa um verniz democrático e negociado, aspectos silenciados da proposta guardam prejuízo e fardos para os servidores. Franco, que estuda temas relacionados à saúde do trabalhador, diz não haver como conciliar produtividade e qualidade de vida. “Quando se aumenta a produtividade de uma pessoa, aumentam-se as horas de trabalho, e então a pessoa não vai ter tanto tempo para a execução de atividades que levem ao seu cuidado pessoal”, explica o docente, lembrando que o próprio termo produtividade, tão empregado nas falas do governo, é de cunho administrativo e significa, basicamente, a rentabilidade do trabalho.

“Isso é extremamente fundamentado nas ideias da administração de Peter Drucker, que afirma que a produtividade é o melhor indicador para se comprovar a eficácia de uma gestão. Para mim esse conceito de produtividade é um conceito destoante de qualidade de vida e o teletrabalho é uma forma de o governo aproveitar para retirar direitos dos trabalhadores”, argumenta Franco.

Etapas

Diana Rodrigues, Coordenadora Geral de Concursos e Provimento de Pessoal, apresentou, durante a live, as etapas para a implantação do teletrabalho: autorização do ministro de estado; elaboração e aprovação dos procedimentos gerais; execução do programa de gestão; acompanhamento e retroalimentação de todo o sistema do programa de gestão. “A autorização do ministro se dá com base na comprovação de que todos os resultados [do trabalho do servidor] podem ser aferidos”, disse. Aqui, novamente, temos a crítica ponderada pelo professor Gianfábio Franco: como aferir de maneira tão acabada o produto do trabalho de um servidor público? A quem serve a quantificação produtivista do serviço público? Onde se encaixa a qualidade de vida, tendo em vista que as tarefas terão tempo pré-definido para serem executadas? Quem determinará esse tempo?

O papel do chefe

Dentre as regras gerais que devem ser estabelecidas pelo dirigente de cada unidade, estão a definição sobre: regimes de execução (parcial ou integral); vedações, quando houver; resultados e benefícios esperados; porcentagem mínima e máxima de participantes, se for o caso; necessidade de tempo mínimo de desempenho das atividades na unidade; percentual mínimo e máximo de produtividade adicional, se houver; conteúdo do termo de ciência e responsabilidade; prazo de antecedência mínima de convocação para comparecimento pessoal.

Haverá a necessidade, também, da realização de uma tabela de atividades, composta pelos seguintes componentes: atividade; faixa de complexidade da atividade; parâmetros adotados para definição da faixa de complexidade; tempo de execução da atividade em regime presencial; tempo de execução da atividade em teletrabalho; ganho percentual de produtividade estabelecido (quando não for fixada produtividade adicional, será igual a zero); entregas esperadas.

Um dos pontos trazidos por Diana é que a atividade laboral exercida em casa tende a ter menos interrupções do que a atividade exercida no local de trabalho, de forma que se espera do servidor em teletrabalho um aumento de 10% na sua produtividade. Cabe ao chefe da unidade estabelecer qual o ganho percentual de se fazer a mesma atividade no regime de teletrabalho. Para Franco, “é contrassenso dizer que, se você está trabalhando em casa, você tem mais tempo. É exatamente o contrário. A gente está muito mais sobrecarregado trabalhando em casa, porque acabamos misturando o ambiente de trabalho com o ambiente familiar”.

Além do mais, o docente ainda critica a propaganda do governo que incentiva os servidores a produzirem mais para ganharem percentuais. “Essa é a lógica de mercado”, contesta.

Ao aderir ao teletrabalho, o servidor e usa chefia acordam um plano de trabalho que deve conter as metas a serem alcançadas, o regime de execução e o cronograma de atividades. Na adesão, o servidor assina um termo de ciência e responsabilidade. Embora esse plano seja acordado, a chefia pode redefinir as metas quando houver necessidade.

Franco, contudo, destaca que, ao assinar esse termo, o servidor se responsabiliza por dispor de recursos tecnológicos e adotar medidas ou providências de segurança. Isso inclui internet, antivírus, energia elétrica, e todo o restante de infraestrutura necessária ao teletrabalho. Ou seja, além de ter adicionais cortados do salário, o servidor ainda terá de arcar com todos os custos do teletrabalho, não recebendo nenhuma ajuda de custo para tal. Como temos percebido ainda durante a pandemia, as contas de casa tendem a aumentar em períodos de trabalho remoto.

Avaliação e assédio moral

Caberá à chefia imediata acompanhar a realização das atividades por parte do servidor e e avaliar as entregas, atribuindo nota entre zero e dez, em que a nota igual ou superior a cinco significa um aceite.

Para Franco, há um elemento bastante preocupante e até mesmo perigoso nesse papel central concedido ao chefe dentro da IN 65, especialmente no que tange à qualidade das relações entre chefia e subordinado. “O foco desse teletrabalho é orientado para o resultado. As metas são avaliados pelas chefias, que dão notas de 0 a 10, onde cinco é meio termo. Mas, se eu tenho uma relação boa ou não com as chefias, isso pode refletir na avaliação das minhas metas?”, questiona o docente. Cabe lembrar que o assédio moral é um tema antigo e um problema quase estrutural no serviço público brasileiro.

Mais algumas informações

Algumas outras informações gerais sobre a IN 65 dadas durante a live dizem respeito ao sistema no qual devem constar as informações das atividades produzidas em teletrabalho. Esse sistema informatizado deve conter: tabela de atividades; plano de trabalho; designação dos executores e avaliadores das entregas; acompanhamento do cumprimento de metas; registro das alterações no plano de trabalho; avaliação qualitativa das entregas.

Os representantes do governo também destacaram que não há atrelamento entre avaliação dos produtos entregues conforme as metas estipuladas no teletrabalho e avaliação de progressão funcional, sendo ambos processos separados. Os vínculos da administração que podem aderir ao trabalho remoto são: cargos efetivos, cargos em comissão de livre nomeação, empregados públicos e contratados temporários.

Para Franco, a IN 65 representa um tema complexo que exige debates aprofundados e muita atenção por parte dos servidores e de suas entidades, principalmente porque o que está em jogo são os direitos dos trabalhadores e uma falsa propaganda de gestão democrática. “Me chama atenção os verbos que eles [representantes do governo] utilizam para falar da IN: potencializar, obedecer, cumprir. São verbos bastante impositivos, não dão a impressão de flexibilidade. Querem nos dizer que é um caminho sem volta”, preocupa-se o docente, para quem o foco principal do governo é enxugar gastos com o serviço público e seus trabalhadores, ainda que isso signifique mais trabalho, mais precarização e mais adoecimento.

A IN 65 tem previsão de ser implementada a partir de 1º de setembro no serviço público federal.

 

Texto: Bruna Homrich

Imagens: Prints Youtube

Assessoria de Imprensa da Sedufsm

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