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26/05/2021
José Renato da Silveira
Professor do Departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSM
“Estou encantada com a falta de programa de Hitler”, escreveu Louise Solmitz em seu diário, “pois um programa é mentira, ou fraqueza, ou planejado para pegar bobos. O homem forte age a partir da necessidade de uma situação séria e não se permite ser restringido”. Uma das conhecidas de Louise Solmitz, antes indiferente ao nazismo, disse que “iria votar em Hitler exatamente porque ele não tinha programa, a não ser a Alemanha”.
Outros relatos na trilogia clássica (A chegada do Terceiro Reich, O Terceiro Reich no Poder, O Terceiro Reich em Guerra) do historiador britânico Richard J. Evans atestam que a falta de um programa e a repetida frase “meu partido, meu programa é a Alemanha” reforçam a forma inovadora de propaganda política do Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães.
Como afirma o professor Oliver Stuenkel: “Hitler sabia como usar a mídia para seus propósitos. Contrastando o discurso burocrático da maioria dos outros políticos, Hitler usava um linguajar simples, espalhava fake news, e os jornais adoravam sugerir que muito do que ele dizia era absurdo. Hitler era politicamente incorreto de propósito, o que o tornava mais autêntico aos olhos dos eleitores. Cada discurso era um espetáculo. Diferentemente dos outros políticos, ele foi recebido com aplausos de pé onde quer que fosse, empolgando as multidões”.
Evidente que as raízes do sucesso nazista jaziam no fracasso do sistema político alemão em produzir um partido conservador viável em âmbito nacional, unindo tanto católicos quanto protestantes de direita; na fraqueza histórica do liberalismo alemão; no amargo ressentimento de quase todos os alemães pela perda da Guerra; pelos duros termos do Tratado de Versalhes; no medo e na desorientação provocados em muitos alemães de classe média pelo modernismo social e cultural dos anos de Weimar e pela hiperinflação de 1923.
Ou seja, a população desejava uma liderança autoritária, alimentava o desejo de uma unidade nacional e havia uma impaciência com a multiplicidade de partidos e os infindáveis compromissos das negociações políticas.
A votação nazista foi, sobretudo, um voto de protesto e o “cabo” Hitler - líder carismático - era uma “aposta” necessária e fundamental.
Evidente que após o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) – 50 milhões de mortos - e a “descoberta” dos campos de concentração (seis milhões de judeus exterminados), há um questionamento inquietante que permeia praticamente todos os livros e documentários sobre a Alemanha nazista: Como permitiram que aquele governo chegasse ao poder? Como diz Oliver Stuenkel, “por que a Alemanha, o país com um dos melhores sistemas de educação pública e a maior concentração de doutores do mundo na época, sucumbiu a um charlatão fascista”?
Há inúmeras hipóteses e teses levantadas sobre essa questão.
Possíveis respostas
Brunhilde Pomsel, que trabalhou por três anos como secretária de Joseph Goebbels (o braço direito de Hitler), diz que "todo o país parecia estar sob a influência de um feitiço".
Oliver Stuenkel “revela” um pouco dessa “feitiçaria evocatória do nazismo”: “De fato, uma análise mais objetiva mostra que, justamente quando era mais necessário defender a democracia, os alemães caíram na tentação fácil de um demagogo patético que fornecia uma falsa sensação de segurança e muito poucas propostas concretas de como lidar com os problemas da Alemanha em 1932. Diferentemente do que se ouve hoje em dia, Hitler não era um gênio. Não passava de um charlatão oportunista que identificou e explorou uma profunda insegurança na sociedade alemã. Hitler não chegou ao poder porque todos os alemães eram nazistas ou antissemitas, mas porque muitas pessoas razoáveis fizeram vista grossa. O mal se estabeleceu na vida cotidiana porque as pessoas eram incapazes ou sem vontade de reconhecê-lo ou denunciá-lo, disseminando-se entre os alemães porque o povo estava disposto a minimizá-lo. Antes de muitos perceberem o que a maquinaria fascista do partido governista estava fazendo, ele já não podia mais ser contido. Era tarde demais”.
Fontes:
BBC NEWS. 'Não me considero culpada': o polêmico testemunho da secretária do braço direito de Hitler. https://www.bbc.com/portuguese/internacional-37098868. Acesso em: 04/05/2021.
EL PAÍS. Por que votamos em Hitler. https://brasil.elpais.com/brasil/2018/10/06/opinion/1538852257_174248.html. Acesso em: 02/05/2021.
EVANS. Richard J. A chegada do Terceiro Reich. Trad. Lúcia Brito. 2 ed. São Paulo: Planeta, 2014.