“Eu não sou seu negro”, documentário inspirado em livro de James Baldwin, é a dica de hoje
Publicada em
11/02/22 15h18m
Atualizada em
11/02/22 15h19m
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Lazaro Camilo, docente da UFSM, comenta que obra aponta as origens da violência racial e desmonta mito do sonho americano
A dica cultural desta sexta-feira, 11, é do docente do departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSM, Lazaro Camilo Joseph, que comenta o documentário “Eu não sou seu negro”. Num momento em que as discussões sobre racismo rompem a quietude e passam a fazer parte da agenda não só de movimentos sociais específicos, mas da mídia e de outros setores sociais, a obra vem para qualificar o entendimento sobre as raízes da opressão racial.
“O documentário aponta para a origem da violência racial, destacando a necessidade que tem a sociedade norte-americana de criar um inimigo que possa incorporar o terror que as pessoas sentem de reconhecer que o sonho americano não funciona [...]”, escreve Camilo. Não surpreendentemente, os apontamentos elaborados para explicar a dinâmica do racismo nos Estados Unidos também podem ser ferramentas para se analisar a realidade brasileira.
Leia, abaixo, a crítica do docente:
“Eu não sou seu negro
O documentário "I'm Not Your Black" é baseado no texto Remember This House, um manuscrito incompleto do escritor, poeta e ativista americano James Baldwin, que faleceu em 1987. Neste manuscrito Baldwin tentou contar a história de seu país (os EUA) através das vidas de Medgar Evers, Malcolm X e Martin Luther King Jr., seus amigos assassinados num intervalo de tempo relativamente curto. Pouco a pouco, o filme mostra a indignação que Baldwin expressa em seu texto a partir de material de arquivo que faz analogia às memórias, denúncias e sentimentos mistos sobre a realidade que ele tinha que viver.
O diretor do documentário é Raoul Peck, que também fez Lumumba (2000), Murder in Pacot (2014) e Young Karl Marx (2017). A voz que narra a história é do ator Samuel L. Jackson, quem lê os textos de Baldwin e as cartas que ele escreveu para seu editor Jay Acton.
O documentário exprime as dificuldades políticas, econômicas e de segregação, a que estão submetidos os afro-americanos nos EUA. Ao mesmo tempo nos leva a refletir sobre a situação atual de violência que se perpetua nos Estados Unidos e que, por analogia, serviria para analisar essa mesma realidade aqui no Brasil.
Por que sugiro assistir a esse documentário?
Acredito que o documentário é essencial para quem deseje entender as origens e profundas ramificações do racismo nos Estados Unidos. "Eu não sou seu negro" é um documentário revolucionário e muito necessário, para desvendar e trazer à tona o problema do racismo que se recusa a sair de nossa sociedade em geral.
O documentário aponta para a origem da violência racial, destacando a necessidade que tem a sociedade norte-americana de criar um inimigo que possa incorporar o terror que as pessoas sentem de reconhecer que o sonho americano não funciona, não porque há alguma falha na fórmula que pode ser corrigida, mas porque esse ideal é concebido sob premissas que são insustentáveis e que hoje enfrentam um de seus declínios mais claros e complexos.
Devemos convir com Noam Chomsky que há muito assinalou a fragilidade do chamado sonho americano. Para Chomsky, um dos maiores problemas com esse ideal é que ele foi projetado apenas para beneficiar a um grupo seleto, minoritário (muito minoritário) da sociedade: a elite branca. Ou seja, trata-se de um país que violenta de todas as formas aquelas pessoas que essencialmente constroem a riqueza e a história norte-americana. Além disso, na ânsia de sustentar essa vida prometida, foram geradas circunstâncias de desigualdade que têm inúmeras consequências e que de forma alguma se aproximam do conceito de democracia. Essa desigualdade pode ser reconhecida em instituições como escolas, sindicatos, bancos e empresas imobiliárias, para citar alguns exemplos, que nos Estados Unidos projetaram seus modelos baseados na segregação racial e na proteção dos interesses daqueles que concentram riqueza e poder.
O documentário "Eu não sou seu negro" foi indicado ao Oscar em 2017 e está disponível no Globoplay e diversas plataformas de streaming”.
Lazaro Camilo Joseph
Docente do departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSM.
Edição: Bruna Homrich/ Assessoria de Imprensa da Sedufsm
Imagens: Pragmatismo Político e Sedufsm