Dica cultural: Um dos melhores podcasts da atualidade é uma sátira
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Atualizada em
06/12/24 16h52m
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“Vrau Cast” reúne absurdos do gênero para promover informação
A consolidação do gênero conhecido como podcast, em especial aqueles baseados em entrevistas, já não é motivo de tanta celebração. Para além da própria saturação que a exploração exaustiva do gênero nos oferece a cada dia, a relativa frequência com a qual o gênero segue um determinado padrão também é motivo de desconforto – ou deveria ser. Afinal, a utilização de um possível canhão de divulgação, que é a internet, por apresentadores despreparados, com opiniões conservadoras – e que, em suas avaliações, podem servir de contraponto a fatos – e mais preocupados em gerar cortes de visualização rápida, certamente não é sinônimo da utopia de democratização da informação tão propagada algum tempo atrás com a popularização da internet. Mas e o que pode ser feito perante um fenômeno que toma de assalto a cultura, tal como os podcasts? Dentre outras coisas, sim, satiriza-lo. Nisso, o já consagrado canal Porta dos Fundos nos oferece um dos mais deliciosos podcasts de entrevista da atualidade, o “Vrau Cast”.
Tudo teve início com a esquete de humor “mais um podcast”, protagonizada por Mike (Caito Mainier) e Cauê (Rafael Saraiva), na qual ambos entrevistam Marcelo Gonçalves (Antonio Tabet), doutor em física nuclear e professor universitário. Com inegável inspiração no “Flow Podcast”, em especial em um de seus apresentadores – de incontrolável prazer por contrapor fatos com opiniões – a esquete inaugural traz o inenarrável momento em que Cauê contrapõe o físico nuclear afirmando que, em sua opinião, ter sua própria bomba atômica deveria ser um direito de todos e todas. É da esquete “mais um podcast”, hoje com mais de 2mi de visualizações, que surgiu a ideia de explorar ainda mais o formato.
Hoje, o “Vrau Cast” é produto fixo e contínuo no canal do Porta dos Fundos. A diferença agora é que Cauê e Mike, a partir de seus cacoetes conservadores, negacionistas e, em muitos casos, baseados em Fake News, entrevistam pessoas reais, especialistas em diferentes assuntos. Já passaram pela bancada do “Vrau” Celícia Olliveira (cofundadora do Intercept Brasil e Diretora do Instituto Fogo Cruzado), Christian Dunker (psicanalista, autor e professor universitário), Orlando Calheiros (antropólogo), Henrique Vieira (pastor e deputado federal) entre outros.
Segundo Caito e Rafael, em entrevista ao canal Comunicação PUC-Rio, a ideia de dois personagens entrevistando pessoas reais dialoga diretamente com o espírito da época em que vivemos, na qual fatos, opiniões e informações falsas se confundem. Mas se engana quem pensa que o “Vrau” tem como objetivo, no final das contas, fazer apenas humor ou usar dois personagens enquanto álibi para absurdos. O podcast do Porta dos Fundos é, certamente, um produto humorístico, mas também informativo. Baseado em um humor de constrangimento, a ideia dos atores é obter boas respostas a partir de perguntas exageradas, caricatas e absurdas. É o caso da entrevista com o advogado e ativista canábico Emilio Figueiredo, na qual Cauê correlaciona a real liberação da maconha em diferentes estados nos EUA com a simbólica liberação da substância em diferentes bairros do Brasil. A pergunta absurda permite ao advogado discorrer sobre a repressão baseada em questões de classe e raça, por exemplo.
Por fim, vale destacar que, segundo Caito e Rafael na já mencionada entrevista para a PUC-Rio, não se trata de desprezar o formato de entrevistas informais e descontraídas. Justamente pelo contrário. A profundidade de uma pergunta não define o nível de sua resposta, destacam os atores – que também admitem não ter referência exclusiva, hoje, neste ou naquele podcast. O fato de o “Vrau” trazer perguntas baseadas em fake news e ignorância cria oportunidade bastante fértil para uma resposta didática. E isso é elemento central no “Vrau Cast”: ser informativo – o que é feito de maneira muito cirúrgica. Afinal, vale lembrar que, assim como quase toda sátira, o podcast do Porta dos Fundos, seja informando, seja fazendo rir, nos permite visualizar, através do exagero cênico, o infeliz absurdo do real.
Texto: Rafael Balbueno
Imagem: Divulgação
Assessoria de Imprensa da Sedufsm