Consulta à comunidade é conquista democrática nas eleições à reitoria
Publicada em
20/07/21
Atualizada em
20/07/21 16h20m
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Pleito para a reitoria da UFSM tem inscrições de dois professores que não participaram da pesquisa com a comunidade

A Comissão Eleitoral divulgou nesta terça-feira, 20, o resultado final das inscrições homologadas ao processo de elaboração da lista tríplice para a escolha de Reitor e Vice-Reitor (gestão 2022/2025) da UFSM. No dia 28 de julho, em reunião ampliada dos Conselhos Superiores, será realizada a eleição e, posteriormente, a lista é encaminhada ao governo federal. Foram homologadas as candidaturas de Luciano Schuch (inscrito aos cargos de reitor e vice), Martha Bohrer Adaime (inscrita aos cargos de reitora e vice), Cristina Wayne Nogueira (inscrita aos cargos de reitora e vice), Genesio Mario da Rosa (inscrito ao cargo de vice-reitor) e Rogério Ferrer Koff (inscrito ao cargo de reitor).
Anteriormente à eleição nos Conselhos, ocorreu, no dia 24 de junho, uma Pesquisa de Opinião Eletrônica com a comunidade acadêmica (docentes, estudantes e técnico-administrativos em educação), para a qual se inscreveram os professores Luciano Schuch, Cristina Nogueira e Martha Adaime. Com 55,41% dos votos, Schuch foi o mais votado pela comunidade. Os demais candidatos inscritos para a composição da lista tríplice (Rogério Koff e Genesio da Rosa) não participaram da pesquisa.
Embora a eleição nos Conselhos seja independente do resultado obtido na consulta/pesquisa à comunidade, os preceitos democráticos apontam para a importância de que os candidatos e candidatas inscritos à composição da lista tríplice tenham participado do processo de consulta. Para o professor do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Estadual do Oeste do Paraná, Wilson Zonin, “o reitor tem que ser uma pessoa com legitimidade, que tenha jogado de uma forma clara com a comunidade, mostrando quais são as suas proposições. Independentemente de ser de direita ou de esquerda, o critério fundamental desse reitor é ter submetido sua proposta de trabalho ao aval da comunidade”.
Zonin era presidente do DCE UFSM em 1989, tendo participado, como representante da entidade estudantil, da comissão responsável por organizar, naquele ano, a consulta à comunidade na eleição à reitoria. Tanto na consulta quanto nos Conselhos, quem ganhou foi o professor Tabajara Gaúcho da Costa. “A democracia pressupõe debate. Um candidato tem que se apresentar para a comunidade com propostas claras. Temos um presidente que fugiu dos debates e hoje está destruindo o meio ambiente, a ciência, a tecnologia, as universidades e os serviços públicos. Não podemos esperar nada de quem não se submete às diretrizes e aos princípios da democracia. A democracia é um valor que todos nós, que passamos pela UFSM, cultivamos”, acrescenta Zonin, para quem a universidade deve dar os melhores exemplos em termos de autonomia e construção democrática.
*Tabajara Costa (d), cuja gestão foi de 1989 a 93, e Paulo Sarkis (c), com gestões de 97/2001 e 2001/2005
A consulta é uma conquista democrática
Marian Noal Moro, diretora da Sedufsm e representante da seção sindical na comissão que organizou a consulta à comunidade para a eleição à reitoria de 1997, ressalta que a consulta foi uma conquista democrática, alcançada especialmente pela mobilização dos estudantes.
“Considero a consulta aos segmentos no processo democrático da UFSM uma conquista que não foi de graça, mas que envolveu muita luta. Quando a democracia fala mais alto e é dado à comunidade o poder de opinar sobre quem vai dirigir a instituição nos próximos quatro anos, esta consulta deve ser garantida, até em consideração à luta e à conquista um dia conseguida. Também existe um comprometimento maior da comunidade que teve a oportunidade de manifestar sua opinião”, diz Marian, ponderando que ainda há diversos avanços democráticos a serem obtidos, a exemplo do voto universal para os três segmentos da comunidade ou, no mínimo, do voto paritário.
Tendo ingressado na UFSM em plena ditadura militar, quando o reitor da universidade ainda era seu fundador, José Mariano da Rocha Filho, ela lembra a campanha pelas diretas já, quando a comunidade universitária, além de reivindicar eleições diretas para presidente da República, também exigia poder escolher seus próprios reitores ou reitoras. Após ser elemento ativo em tantas décadas de luta pela democracia, ela considera um retrocesso o fato de, hoje, alguns candidatos à reitoria abrirem mão de participar da consulta à comunidade.
“Isto de certa forma pode demonstrar um medo da pesquisa dos segmentos. Um medo que a democracia universitária apontasse sua vontade, deixando de lado quem se inscrevesse para participar. Mas se isto ocorrer será muito difícil conseguir gestar uma universidade pública, democrática e socialmente referenciada. Não devemos retroceder, mas sim avançar, o que temos hoje é muito pouco, mas não podemos correr o risco de perder o que já temos”, conclui a dirigente da Sedufsm.
*(à esquerda) Clovis Lima, que em 2005 sucedeu Paulo Sarkis
O ônus da ilegitimidade
Quem também compartilha de visão semelhante acerca da importância da participação na consulta é Cerlene Machado, a Tita, técnica-administrativa em educação que participou, pela Assufsm, da comissão responsável por organizar a consulta nas eleições à reitoria de 1997. Ela explica que a consulta é uma ferramenta fundamental para conferir legitimidade ao futuro reitor ou reitora.
“Essa legitimidade é dada por quem faz a Universidade, ou seja, os discentes, docentes e técnicos e técnicas administrativas em educação. Acredito que um candidato ou candidata ao cargo máximo da instituição deve manter uma relação ética com os segmentos que a compõem, além de respeitar as peculiaridades de cada segmento e a construção de unidade na ação no que se refere à defesa da educação pública, gratuita, de qualidade e democrática”, opina a servidora.
Para Tita, a consulta permite que a comunidade tenha acesso aos projetos de universidade defendidos por cada um dos candidatos ou candidatas, bem como avalie seus níveis de comprometimento “com a democracia interna, com a defesa da autonomia e com a transparência na gestão; o respeito à liberdade de expressão; o combate a toda forma de preconceito; determinação, disposição política em manter e ampliar os espaços de inclusão social; dentre outros pontos”.
Recusar-se a tomar parte na etapa da consulta, que é onde o diálogo com a comunidade está mais presente, é, para ela, a atitude de um interventor. “Ninguém será legítimo se não tiver o respaldo do conjunto da comunidade universitária. Alguém que se recusa a submeter seus projetos à avaliação, com certeza NÃO ESTÁ A SERVIÇO dos objetivos da Universidade. É um interventor e, como tal, é um mero instrumento, passivo, um mandalete dos interesses alheios aos princípios basilares da instituição que pretende gerir. Digo "pretende gerir" porque não terá condições morais, éticas e políticas para tanto. Este tipo de intervenção será rechaçada com veemência pelas entidades representativas”, conclui Tita.
Também técnico-administrativo em Educação, Celso Fialho reforça o tamanho do ônus político a ser assumido por um reitor ou reitora que não receba o sinal afirmativo da comunidade universitária. “Envolver os segmentos que constroem cotidianamente a instituição no processo de escolha de seus dirigentes é fundamental”, diz ele.
“Um dirigente que assume um cargo de gestão sem o respaldo da comunidade demonstra sua intenção em garantir a exclusividade de uma classe sobre o conhecimento, instrumentando parte da sociedade para se impor sobre o povo. Os estudantes, os técnico-administrativos em educação e os professores, instrumentos do conhecimento, devem unir-se e denunciar este golpe à democracia, golpe encaminhado por um governo que destrói a soberania nacional, que cria desigualdades abissais entre as classes, um governo cujo legado será a destruição”, critica Fialho.
Intervenção
Luciano Ribas foi coordenador do DCE UFSM entre 1992 e 1994, tendo sido, também nesta época, membro do Conselho Universitário. Em 1993, a consulta à comunidade (e posterior eleição nos Conselhos) garantiu a vitória ao professor Odilon do Canto. Para Ribas, que hoje atua como designer gráfico, publicitário e fotógrafo amador, a consulta é uma forma de materializar os princípios democráticos dentro da universidade. Logo, quem não se propõe a dela participar, expressa autoritarismo e falta de compromisso com o exercício da cidadania.
Em caso de alcançar o posto de reitor alguém que tenha se abstido da consulta, Ribas acredita que a alcunha de interventor, ao invés da de reitor, seria mais apropriada. “Nenhum professor ou professora que honre sua função poderia sequer imaginar assumir esse papel. Penso, ainda, que qualquer pessoa que cogitasse aceitar essa desonra não passaria de um covarde, pois não enfrentaria a campanha e o crivo dos segmentos. Isso revelaria sérios problemas de personalidade, materializados na ambição desmedida que é desejar uma posição tão importante a qualquer preço, incluindo nele a própria dignidade”.
Representação política
A escolha de um reitor ou reitora para a universidade é um processo que exige seriedade e comprometimento, visto que tal pessoa será aquela que representará, por exemplo, a instituição nacionalmente, em fóruns de reitores ou negociações com o governo. Quem lembra isso é Zonin, que já foi candidato, por duas vezes, à reitoria da Universidade Estadual do Oeste do Paraná.
“Submeti-me a essas regras da democracia, e entendo que a comunidade escolheu outro candidato. Temos que contribuir com o debate e aceitar o resultado das urnas. A universidade tem que ser exemplo de respeito à democracia. É importante um reitor que se posicione diante das questões políticas, que ajude a defender os investimentos, a ciência e a tecnologia, não um reitor alinhado com o obscurantismo e com o desmonte de tudo isso”, conclui o docente, que coordena o Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural e Sustentável, de caráter interdisciplinar.
Até janeiro deste ano, cerca de 20 instituições federais de ensino - entre universidades, institutos e centros federais - estavam sob intervenção no país. Isso significa que elas têm, em suas reitorias, pessoas consideradas interventoras, já que foram nomeadas pelo presidente Jair Bolsonaro, através do Ministério da Educação, em despeito aos resultados obtidos nas consultas e na formação das listas tríplices. Ou seja, tais pessoas foram nomeadas para as Administrações Centrais à revelia da vontade das comunidades universitárias ou mesmo dos integrantes dos Conselhos Superiores.
Posicionamento da Sedufsm
Nesta última segunda-feira, 19, a diretoria e o Conselho de Representantes da Sedufsm manifestaram seu posicionamento acerca do processo sucessório para a reitoria da UFSM. Leia aqui.
Texto: Bruna Homrich
Fotos: Arquivo Geral da UFSM e Arquivo Sedufsm
Assessoria de Imprensa da Sedufsm
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