Entidades mobilizam-se contra cobrança em cursos de pós-graduação na UFSM SVG: calendario Publicada em
SVG: atualizacao Atualizada em 18/11/21 23h11m
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CEPE discute nesta sexta, 19, a partir das 8h30, possibilidade de cobrança em cursos de pós-graduação lato sensu

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Entidades convocam ato para a frente da reitoria, em concomitância com reunião do CEPE

Entrará em discussão na reunião do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE) desta sexta-feira, 19, a proposta de resolução que, dentre outras questões, autoriza a cobrança de taxas e mensalidades em cursos de pós-graduação lato sensu – ofertados de forma não regular na instituição. A sessão pode ser acompanhada a partir das 8h30, pelo site do Farol UFSM. O tema entraria na pauta da reunião do Conselho ocorrida em 22 de outubro, contudo, visando a melhor preparar a mobilização junto à comunidade universitária, representações estudantis solicitaram, na ocasião, vistas do processo. 

A proposta não é nova. Nos últimos anos, tem crescido a pressão para que a universidade oferte cursos pagos. Em 2017, por exemplo, a Assessoria de Imprensa da Sedufsm procurou a Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa da UFSM após ter acesso a relatos de professores e professoras que informaram estar em elaboração, na instituição, uma proposta para regulamentar a cobrança. À época, a informação foi confirmada: de fato, preparava-se a minuta, que, após debate, deveria ser apreciada pelos Conselhos Superiores. Posteriormente, inclusive, a categoria docente, reunida em assembleia, aprovou uma moção de repúdio  à criação de cursos pagos na universidade. Ocorre que o debate com a comunidade acadêmica, seja em 2017, seja nos anos subsequentes, parece não ter sido feito.

É o que ressalta Maurício Fanfa, doutorando em Comunicação Social, integrante da Associação de Pós-Graduandos(as) da UFSM e relator do pedido de vistas da minuta no CEPE. Ele explica que, em certa parte da minuta que será discutida nesta sexta, é citado o fato de que o documento teria sido enviado, em dezembro de 2017, aos centros. E, de fato, isso aconteceu. Contudo, o prazo dado às direções para que se posicionassem foi bastante curto.

“Foi apenas um email disparado para os centros, e o prazo para debate foram poucos dias. E não é vinculada ao processo [minuta atualmente em debate] nenhuma resposta de centro. Então nenhum centro respondeu àquele email de 2017, nem se posicionando a favor, nem contra a resolução. Isso demonstra uma pobreza na motivação e incentivo ao debate. Sendo uma questão tão polêmica, ela é debatida à exaustão no nível jurídico, mas não fica evidente um interesse por parte da comunidade universitária, e mesmo da comunidade externa, em ter esse tipo de cobrança nos cursos. Gostaríamos que ao longo desse processo tivesse sido estimulado mais o debate”, pondera Fanfa.

A legalidade, diz o estudante, é a principal tônica utilizada pelos setores que defendem a cobrança de cursos pagos. Das cerca de 200 páginas que contém a minuta, pelo menos 120 são dedicadas a atestar a legalidade de cobranças em cursos lato sensu. Em 2017 realmente o Supremo Tribunal Federal (STF) admitiu ser possível que universidades públicas cobrem mensalidades em cursos de especialização lato sensu. Contudo, tanto o estatuto da Ufsm quanto a própria Constituição Federal não admitem cobranças na universidade. 

“No processo inteiro tu percebe aquela organização argumentativa sobre um assunto polêmico. Quero dizer com isso que, se o assunto não fosse polêmico, não teriam tantas páginas assim discutindo sua legalidade”, comenta. Segundo entendimento do STF, os cursos de especialização lato sensu não comporiam a gama de serviços que a universidade é constitucionalmente obrigada a ofertar de forma pública e gratuita. Por não terem oferta regular, sendo episódicos e não compondo a grade permanente de cursos, poderiam cobrar taxas sem, com isso, ferir o caráter público e gratuito do ensino superior.

Legalmente, o debate é esse. Ocorre que a reflexão que vem sendo proposta pelas entidades representativas dos segmentos, em conjunto com diversos coletivos que atuam dentro e fora da universidade, é a seguinte: embora a lei permita, será que a UFSM deve, de fato, abrir a porteira para a cobrança na pós-graduação? Será que o debate deve se assentar sob bases legalistas ou sob a defesa de que o acesso à universidade pública seja universal? Por que, enfim, romper com a gratuidade?

Escolha elitista

Para Ascísio Pereira, vice-presidente da Sedufsm, ao aprovar a cobrança em cursos de pós-graduação, ainda que de oferta não regular, a universidade faz uma escolha elitista, visto que alija do acesso a tais cursos todas as pessoas que não possuam condições financeiras para arcar com as taxas ou mensalidades.

“Legalmente a universidade pode cobrar, o STF autorizou. Agora, tudo que é possível, é desejável? Quer dizer, a universidade deseja de fato legislar e excluir pessoas que não podem pagar? Ter cursos pagos significa uma escolha elitista da universidade. A universidade quer, moralmente, fazer essa escolha?”, questiona Pereira, lembrando que o acesso universal é o mais democrático, visto que não exclui ninguém. Assim, enquanto os cursos gratuitos podem ser acessados por todos que tenham condições de concorrer à vaga – independente de suas condições financeiras -, os cursos pagos só poderão ser acessados por quem tem como pagar.

Além disso, o dirigente da Sedufsm acredita que aprovar a cobrança em cursos lato sensu pode ocasionar uma abertura maior da porteira pela qual o governo Bolsonaro – e seus tentáculos em universidades e demais instituições públicas – quer fazer passar a boiada da retirada de direitos. Isso significa que, pela fresta da porta a ser aberta caso a minuta em questão seja aprovada, podem passar projetos de privatização de outros setores da universidade.

Pereira lembra que processo semelhante ocorreu na Europa. Por lá, a maior parte das universidades eram públicas e universais. Desde a assinatura, por diversos países, do Acordo de Bolonha, tais instituições passaram a ser privatizadas. É um alerta para o Brasil. “Não estamos vivendo um momento em que podemos abrir mão das coisas que são essenciais.  Estamos numa situação muito complicada”, defende.

Entidades contrárias

Assim como a Sedufsm, a Assufsm também manifestou-se intransigentemente contrária à minuta que prevê a cobrança de cursos de pós-graduação lato sensu.

“O momento conjuntural impõe desafios a toda a Classe Trabalhadora, em particular, às e aos profissionais de educação. Nossa luta é construída por instrumentos que reforcem a nossa resistência na luta contra o projeto neoliberal,  que ameaça a democracia e soberania no nosso país. Essa aprovação impactaria na defesa da educação pública,  gratuita e de qualidade social, ameaçada por governos e Gestões das Universidades submissas aos interesses do capital nacional e internacional  e descompromissados com a maioria do povo brasileiro - excluída dos mínimos direitos de cidadania”, escreve Eloiz Guimarães Cristino, coordenador de Formação Política e Sindical.

Cláudia do Amaral, coordenadora geral do Sinasefe Santa Maria, lembra a frase que diz: “Um dia alguém lutou para eu poder estudar. Hoje luto para isso não acabar”. Ela própria diz que, se tivesse de pagar por sua pós-graduação, provavelmente não a teria conseguido fazer.

“A não gratuidade compromete o caráter público da universidade, porque o acesso passa a não ser democrático. Só quem tem dinheiro pode entrar. Então realmente é uma tristeza e esperamos que isso não aconteça. As pessoas têm de se manifestar, assinar o abaixo-assinado. Com certeza é uma medida que vai restringir a entrada e a formação das pessoas em nível de pós-graduação. É lamentável”, avalia a professora.

Daniel Balin, integrante do DCE UFSM, analisa que aprovar a resolução com os itens que preveem a cobrança significaria trazer, para dentro da universidade, a lógica de privatização.

“O acesso à universidade, incluindo os cursos de especialização, é direito de todos e todas, e isso não deve ser limitado por condições financeiras. Sabemos que aprovar essa possibilidade vai ser colocar a universidade à disposição das elites de novo, sob uma lógica de mercado que vai contra todos os desejos de uma universidade mais inclusiva”, reflete.  

Autonomia

Maurício Fanfa chama a atenção para outro aspecto envolvido na discussão sobre a cobrança em cursos de pós lato sensu: a autonomia universitária.

“Acreditamos que o acesso ao ensino em estabelecimentos públicos deve acontecer independente de condições financeiras por parte dos alunos. Também acreditamos que a oferta desses cursos por universidades públicas como a UFSM não pode ser interferida por interesses mercadológicos. Para a universidade ser autônoma e servir aos interesses da sociedade, precisa ter suas ofertas realizadas com muito rigor e muito critério. Então é necessário financiamento público para esse ensino público”, pondera o estudante. Ele explica que a ideia é sugerir ao CEPE a aprovação da minuta para cursos de especialização lato sensu, contudo sem os artigos que incluem a possibilidade de cobrança.

Abaixo-assinado e ato na reitoria

A minuta deveria ter sido discutida na última reunião do CEPE, contudo, frente ao pedido de vistas, chegará ao debate entre conselheiros e conselheiras nesta sexta. Desde a última semana, as entidades representativas da UFSM têm feito circular nas redes sociais um  abaixo-assinado contra a cobrança nos cursos de pós-graduação na UFSM. Até então, 629 pessoas já assinaram.

Para esta sexta também está sendo convocado um ato a partir das 9h, em frente ao prédio da Reitoria, no campus da UFSM, para manifestar a rejeição à proposta. Aos conselheiros e conselheiras que estarão na sessão virtual, as entidades e coletivos lerão e entregarão uma carta, objetivando sensibilizá-los a respeito dos riscos que a aprovação de uma minuta como essa representaria para o caráter público, gratuito e democrático da universidade.

Leia, abaixo, o conteúdo da carta que foi assinada por 19 entidades:

Carta contra a cobrança nos cursos de especialização eventuais na UFSM

Caras conselheiras e conselheiros do CEPE da UFSM,

Somos entidades sindicais e de representação estudantil da UFSM, organizações e coletivos políticos atuantes na cidade.

Escrevemos para pedir especial atenção à minuta de Diretrizes e Normas Institucionais para os Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu a ser debatida na próxima sexta-feira, dia 19/11/2021, no Conselho.

Pedimos que o conselho não aceite que a UFSM decida cobrar por nenhum curso. Apresentaremos nosso parecer de vistas que visa aprovar a resolução, porém suprimir os artigos que permitem eventuais cobranças nos cursos de pós-graduação.

Acreditamos que o acesso à universidade pública, incluindo cursos de especialização eventuais, é direito de todes e, por isso, não deve ser limitado por condições financeiras.

É preciso observar e denunciar irredutivelmente o caráter limítrofe da Emenda Constitucional 95, conhecida como PEC do Teto de Gastos, que no ensino superior se reflete em uma constante precarização que abre cada vez mais espaço para a iniciativa privada, no horizonte da privatização. Sua revogação é condição central para o avanço das pautas estudantis.

Iniciativas como esta cobrança vêm no sentido de impregnar a universidade pública com a linha privatista neoliberal, que tem sido a pauta do dia desde o golpe de 2016. Em contraponto à uma universidade elitista e excludente, pautada a partir do projeto Future-se, colocamos a reivindicação por uma universidade inclusiva e popular.

O ensino público deve, em verdade, servir à sociedade. E, para servir em toda sua potencialidade, precisa - primeiramente - contar com um financiamento totalmente público.

Contamos com as senhoras e senhores conselheiros na defesa da universidade pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada.

Atenciosamente,

Associação das e dos Pós-graduandas/os da UFSM (APG-UFSM)

Associação das e dos Servidores da Universidade Federal de Santa Maria (ASSUFSM)

Central Única dos Trabalhadores - Regional Centro (CUT)

Coletivo Juntos (JUNTOS!)

Coletivo Práxis de educação popular (PRÁXIS)

Diretório Acadêmico da Geografia - UFSM (DAGEO)

Diretório Acadêmico da Psicologia (DAPSI)

Diretório Central das e dos Estudantes da UFSM (DCE-UFSM)

Juventude da Articulação de Esquerda (JAE)

Juventude do Partido dos Trabalhadores (JPT)

Levante Popular da Juventude (LPJ)

Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)

Movimento por uma Universidade Popular (MUP)

Programa de Pós-Graduação em Educação - UFSM (PPGE)

Seção Sindical de Docentes da UFSM (SEDUFSM)

Sindicato Nacional das e dos Servidores Federais - Seção Sindical Santa Maria (SINASEFE)

Sindicato Nacional dos Técnicos de Nível Superior (ATENS)

União da Juventude Comunista (UJC)

União Estadual dos Estudantes (UEE Dr. Juca)".

 

Texto: Bruna Homrich

Imagens: DCE UFSM

Assessoria de Imprensa da Sedufsm

 

 

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