Liderança indígena fala sobre a luta contra as diversas formas de violência que afetam as mulheres
Publicada em
01/08/25
Atualizada em
01/08/25 16h16m
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Joziléia Kaingang, entrevistada da edição 106 do ‘Ponto de Pauta’, destaca temas da 4ª Marcha das Mulheres Indígenas

A principal bandeira dela é a luta contra a violência aos corpos e contra o território. “Nós lutamos pelos nossos direitos territoriais, porque nós entendemos que a gente só vai poder ter territórios seguros, corpos seguros, quando a gente tiver territórios desentrusados (*) e terras demarcadas”. A afirmação é de Joszléia Kaingang, doutora em Antropologia Social pela Universidade Federal de Santa Catarina e uma das fundadoras da Articulação Brasileira de Indígenas Antropólogas, a ABIA.
Joziléia concedeu entrevista esta semana ao programa ‘Ponto de Pauta’ (PP) da Sedufsm (ver ao final), edição nº 106, para falar um pouco, entre outros assuntos, da 4ª Marcha das Mulheres Indígenas, que ocorrerá no dia 7 de agosto, em Brasília. Este ano, o evento tem como tema Nosso Corpo, Nosso Território, Somos as Guardiãs do Planeta pela Cura da Terra.
Durante as atividades da Marcha acontecerá também a Conferência Nacional das Mulheres Indígenas, que é organizada pela ANMIGA (Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade), da qual Jozi é cofundadora e diretora executiva.
A líder indígena destaca em sua entrevista que uma das grandes lutas da ANMIGA no enfrentamento à violência é exatamente para que as mulheres tenham condições de viver de forma digna nos territórios indígenas, e para que consigam fazer parte das políticas públicas que o Estado brasileiro oferece no enfrentamento às várias formas de violência.
E a questão de defesa dos corpos e dos territórios não está desvinculada de outros aspectos, como por exemplo, o enfrentamento à crise climática. Joziléia explica que o próprio tema da marcha deste ano reflete essa preocupação: “somos as guardiãs do planeta pela cura da terra”.
Segundo ela, os povos indígenas protegem 83% da biodiversidade do planeta e isso não é pouco, pois são apenas 5% da população mundial. Por isso, diz Jozi, “é nossa responsabilidade, enquanto guardiãs do planeta, fazer a defesa dos territórios e a permanência constante no enfrentamento às emergências climáticas e, nesse enfrentamento, também a gente traz a pauta contra a violência.”
Ambiente e emergências climáticas
Joziléia ressalta que as mulheres indígenas são vítimas importantes do que chama de violência ambiental. Conforme a análise feita por ela, as “meninas indígenas estão extremamente vulnerabilizadas nas emergências climáticas”. O motivo, diz a líder, é que não foram construídos projetos ou programas que salvaguardem esse segmento no caso de picos extremos das emergências climáticas, como ocorreu no Rio Grande do Sul.
Ela cita que mulheres indígenas de etnias como Kaingang, Guarani, Xokleng, Charrua, estão entre as que foram grandemente impactadas pelas emergências climáticas, com as inundações que aconteceram no Rio Grande do Sul em 2024. Por isso, a líder comenta que é preciso avaliar o tamanho desse impacto entre essas mulheres e se as políticas públicas abrangeram a todas ou não.
Saúde indígena e racismo institucional
Em seu depoimento ao Ponto de Pauta, Joziléia argumenta sobre outros tipos de violência que as mulheres indígenas sofrem, como é o caso da questão do tratamento de saúde. “Nós temos uma Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e um atendimento à saúde indígena que é específico para os primeiros cuidados. Então, é especificamente para a atenção primária”. Ou seja, tudo que sai da atenção primária não tem espaço para atendimento. “Quando se vai para uma média complexidade, para uma alta complexidade, as mulheres indígenas ficam extremamente vulneráveis. Primeiro, por conta da barreira linguística”, assinala Jozi.
Segundo ela, em várias situações, os/as profissionais de saúde não conseguem entender que às vezes é um rezo (forma de oração) e um chá que elas (mulheres indígenas) precisam para poder se fortalecer e seguir com o tratamento adequado. “E aí gera um racismo”, argumenta a líder indígena, que complementa: “Quando as mulheres indígenas vão para a universidade, o racismo institucional às vezes também é violento”.
Para Jozi, embora se tenha vencido várias barreiras contra o racismo, ainda assim persistem muitas violências institucionais. “No próprio sistema de tratamento de políticas públicas, no acesso à assistência social, às vezes do município, também são cometidas violências contra as mulheres. O racismo ainda é muito forte”, frisa ela.
(*) Território desentrusado refere-se a um território, geralmente indígena, onde foi realizada a desintrusão, ou seja, a retirada de pessoas que o ocupavam ilegalmente. Essa ação visa proteger o território e seus habitantes, restaurando a posse e o direito dos povos originários sobre suas terras.
Acompanhe abaixo, a íntegra da entrevista ao PP que está no canal da Sedufsm no Youtube.
Texto: Fritz R. Nunes
Imagem/arte: Italo de Paula
Vídeo: Jefferson Pinheiro
Assessoria de imprensa da Sedufsm
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