Seções do ANDES no RS discutem papel sindical nas ações de combate a violências como o machismo e o racismo SVG: calendario Publicada em 04/11/25
SVG: atualizacao Atualizada em 04/11/25 16h07m
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Seminário que aconteceu na sexta, 31, na sede do IFRS, em Porto Alegre, foi considerado exitoso e deverá ter novas edições

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Neila Baldfi (microfone) na mesa que discutiu formas de combate às opressões nas Instituições Federais de Ensino

Faltam políticas públicas permanentes para o combate à violência de gênero e feminicídios no Estado do Rio Grande do Sul, criticou a deputada Fernanda Melchionna (Psol-RS), na mesa de abertura do “Feminicídios Cotidianos. Caminhos para o enfrentamento das violências de gênero”, realizado pela Secretaria Regional do ANDES-SN e seções sindicais gaúchas, na tarde de sexta, 31 de outubro, no Auditório do IFRS, em Porto Alegre.

Contudo, o problema não se resume à ausência de políticas, mas também ao fato de que as que existem, muitas vezes não são cumpridas de forma adequada. É o caso da lei de cotas no serviço público. Simone Alvarez, docente da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Rio Grande (FURG), que coordenou uma das mesas de debate, expôs, de maneira emocionada, outra violência: o caso de racismo que sofreu.

Depois de ter sua nomeação barrada após aprovação em concurso, Simone teve que ingressar na justiça em 2021 para poder assumir o cargo de docente da instituição. A dificuldade em ser nomeada como uma assistente social negra da UFSM também foi enfrentada por Ângela Souza, servidora da UFSM e atualmente integrante da coordenação do Núcleo de Estudos Afrobrasileiros e Indígenas (Neabi) da universidade.

Ao longo da tarde, até o início da noite de sexta, as e os participantes do seminário puderam ouvir e discutir sobre essas temáticas que mostram a realidade nua e crua das diversas formas de violência contra mulheres, pessoas negras e população LGBT. Durante o evento ocorreram três mesas de discussão, com abordagens distintas. A primeira mesa, com Fernanda Melchionna, tratou de Violências de gênero no RS, com exposição e análise de dados, tendo como mediadora a professora Angélica Miranda (Aprofurg).

A segunda mesa teve como tema Mulheres negras e suas experiências nos ambientes de trabalho, com Angela Souza de Lima - servidora e coordenadora do NEABI/UFSM, Adriana Centeno, advogada e servidora pública que integra a Associação Mães Pretas em Porto Alegre, sob a coordenação de Simone Quadros Alvarez, docente da Escola de Enfermagem da Federal de Rio Grande (FURG).

E a terceira e última mesa 
abordou as Políticas de enfrentamento às opressões nas instituições de ensino públicas, com a participação da professora Letícia Carolina Nascimento, diretora do ANDES- SN, Cátia Gemelli (do SindoIF) e Neila Baldi (Sedufsm), com a mediação da professora Lauri Miranda, do Sindoif.

Políticas ausentes

A formulação de políticas com as suas devidas estruturas, como delegacias especializadas, por exemplo, deveria ser uma preocupação dos diversos níveis do Estado do Rio Grande do Sul, mas não é o que se constata, conforme a deputada Fernanda Melchionna, que coordena a comissão da Câmara Federal para acompanhamento dos casos de violência contra mulheres no Rio Grande do Sul.

Além de estrutura física e humana para a polícia atender os crescentes casos de violência doméstica e feminicídios, seria necessária também a construção de uma política educativa, de conscientização da sociedade, com a inserção, por exemplo, de disciplinas relacionadas ao tema, que falassem sobre a Lei Maria da Penha, entre outros assuntos, nas escolas e até mesmo nos currículos das universidades, defendeu a parlamentar.

A deputada do Psol reforçou seus argumentos de que o combate ao machismo e aos diversos tipos de violência não é uma prioridade do Estado apresentando números. Segundo Fernanda, dos 497 municípios gaúchos, somente 23 possuem delegacias especializadas que estão em atividade. No período mais recente, comentou ela, houve a abertura de apenas uma nova delegacia, sendo que duas outras foram fechadas. Do total de municípios gaúchos, apenas 56 possuem grupos reflexivos de gênero, acrescentou a parlamentar.

Fernanda Melchionna afirmou ser parceira para a construção de projetos que tenham no horizonte o combate à violência de gênero. Ela disse que seria importante, por exemplo, o ANDES-SN se debruçar sobre campanhas internas ou mesmo se aprofundar no debate sobre alterações curriculares, nas diferentes áreas, citando cursos como Medicina, Engenharia, Direito, que contemplassem uma visão de contraposição ao machismo e ao patriarcado.

Nesse contexto, a deputada citou que a luta contra o projeto de Reforma Administrativa também é importante, pois alterações feitas na carreira, com a retirada de direitos, não atingem a todos e todas de forma igualitária. Segundo ela, as mulheres, devido a suas inúmeras jornadas de trabalho, sempre são as mais prejudicadas.

Basta ter política?

A UFSM possui uma Comissão de Igualdade de Gênero desde 2018 e uma Política de Igualdade de Gênero aprovada pelo Conselho Universitário desde 2021. Na sequência, em 3 de novembro de 2021, foi criada a Casa Verônica, um espaço multiprofissional para atender vítimas de violência de gênero, que resultou dessa mobilização interna na instituição.

Em que pese essas iniciativas importantes, a universidade ainda segue sendo um lugar em que há prática de assédio, por exemplo, com poucas ações resolutivas que evitem esse tipo de violência. A constatação é da professora Neila Baldi, do curso de Licenciatura em Dança da UFSM, também diretora da Sedufsm, e que participou da terceira mesa, sobre o enfrentamento às opressões nas universidades.

Na visão da docente, a política é importante, mas não basta. É preciso ter estratégias para tirar a política do papel e colocá-la em prática, avalia. Neila comentou ainda que umas das propostas em discussão no Grupo de Trabalho de Políticas de Classe para Questões Étnico-raciais, de Gênero e Diversidade Sexual (GTPCEGDS), que poderá ser levada para a Administração da UFSM, é instituir um processo de capacitação de quem recebe denúncias, como é o caso da Ouvidoria da instituição, para que as violências sejam averiguadas e não simplesmente ignoradas.

Para a diretora da Sedufsm, é essencial refletir sobre de que forma as seções sindicais podem fazer para enfrentar os diversos tipos de violência na universidade. Uma ideia que vem sendo aventada na Sedufsm é a possibilidade de os sindicatos criarem uma ouvidoria própria para auxiliar no encaminhamento dessas questões. Além disso, ressaltou que é importante debater uma política orçamentária, que valorize esses temas. Não pode uma instituição como a Casa Verônica ser mantida basicamente por emenda parlamentar, frisou a docente. Ela também informou que a partir do GTPCEGDS, a Sedufsm vai levantar resoluções em outras instituições para a construção de protocolos contra o assédio e, assim auxiliar na construção de um específico na UFSM.

Identitarismo

Leticia Carolina Nascimento, 2ª Vice-presidente do ANDES-SN, professora da Universidade Federal do Piauí, mulher negra e trans, fez um desabafo. Segundo ela, no próprio movimento sindical há segmentos importantes que acusam quem aborda as temáticas de gênero ou raciais de reduzir as ações políticas ao aspecto “identitário”, o que levaria, segundo esses críticos, à fragmentação das lutas.

A diretora do ANDES-SN, que também é da coordenação nacional do GTPCEGDS, enfatiza que o Sindicato Nacional, durante muito tempo, tinha uma prática machista, justamente porque era dirigido, em sua maioria, por homens, diferente dos dias atuais, em que há paridade de gênero no comando da instituição. Segundo ela, o machismo arraigado demonstra que “apenas o marxismo não dá conta de tudo”, pois muitos desses sindicalistas eram competentes, qualificados, mas reproduziam essa visão machista. “Achar que apenas o marxismo daria conta seria negar a dialética”, argumenta Leticia.

Foi lembrado durante o espaço de manifestação do público presente ao seminário, que certas práticas, como a do assédio, estão tão incrustadas que, para eventos como o Congresso do ANDES e o Conad, precisou ser criada uma comissão de combate ao assédio.

Para Leticia, um dos aspectos relevantes do debate que tem sido aprofundado no sindicato é que o identitarismo cria laços sociais. “Eu tenho consciência de classe, mas também tenho consciência de raça”, sublinha a docente. Nesse sentido, ela defendeu como de suma importância a campanha antirracista promovida pelo ANDES-SN: “um grande avanço”, disse.

Catia Gemelli, professora do Instituto Federal (IFRS), campus Porto Alegre, também vice-presidente do Sindoif, ressaltou que, mesmo no ambiente universitário, é preciso lembrar a todo o instante que não deve haver práticas machistas, racistas, lgbtfóbicas. Todavia, ela constata que há uma dificuldade no que se refere à conscientização, pois mesmo quando ocorrem eventos, como o próprio seminário da sexta-feira, a participação é pequena, e os homens, que deveriam estar mais interessados, quase não aparecem.

A falta de debate sobre essas temáticas, ressaltou Catia, faz com que as pessoas não tenham a percepção de que as várias dimensões da vida profissional são atravessadas por questões de gênero e raça. Um olhar para o tema da carreira, do mercado de trabalho, mostra o quanto se é afetado por essas questões, frisa ela.

Universidade: ‘espaço hostil para os corpos pretos’

Os números não mostram tudo, mas são importantes para que uma realidade possa ser interpretada. Durante a sua fala, na mesa 2, Angela Souza, do Neabi/UFSM, trouxe dados referentes à UFSM que causaram bastante impacto.

Na universidade são 2.257 TAEs, servidores técnico-administrativos/as em educação. Desse total, 252 são negros (as), sendo 161 pardos/as e 91 pretos/as.

No caso de docentes, o total é de 2.047 em atividade. Desses, 90 são pardos/as e 12 são pretos/as.

Em relação aos cargos de chefia na universidade, conforme Angela, há um total de 863.

Dessa totalidade, 785 são brancos/as, 52 são pardos/as e 22 pretos/as. Nesses cargos, a maioria é ocupada por homens, acrescenta ela.

Segundo a técnico-administrativa, essa não é uma realidade muito diferente de outras universidades, lembrando também que na pós-graduação da UFSM, a presença de negros/as ainda é incipiente.

Para Angela, esse espaço de “branquitude” na instituição, em que ser negro/a é quase uma exceção, causa efeitos até mesmo na saúde de uma mulher que é a única assistente social preta na UFSM. Diante dessa realidade, a coordenadora do Neabi descreve a universidade como “um espaço hostil para os corpos pretos”.

Entretanto, a realidade adversa não a desestimula. Além de integrar o Neabi da UFSM, Angela participa intensamente de atividades dentro e fora da universidade que buscam contribuir para o debate sobre a questão racial. Mas, ela entende que essas discussões não devem estar focadas apenas entre negros/as, mas envolver toda a comunidade. “A branquitude também tem que combater o racismo”, afirma.

Simone Alvarez, docente de Enfermagem da FURG, que viveu a situação de ser preterida em um concurso para docente na instituição, relatou a confusão sentimental de quem passou por esse tipo de experiência. Diante de tantas dificuldades, Simone, que fez sua graduação e pós-graduação na Federal de Rio Grande, chegou a se questionar se realmente deveria insistir na busca da vaga (que acabou sendo alcançada mediante ação judicial), e se a docência naquela instituição realmente era um espaço para ela, tal o abalo psicológico sofrido.

Para solucionar esse tipo de situação, que faz parte de uma mentalidade forjada pelo racismo estrutural, a professora acredita que é preciso investir em uma educação antirracista, que passa por todos os níveis de ensino, desde a escola básica até a universidade.

Da mesma mesa participou Adriana Centeno, da Associação Mães Pretas, de Porto Alegre. Ela explicou que a entidade atua desde 2019 promovendo um ambiente seguro e acolhedor para que mães pretas possam compartilhar suas experiências e desafios. A organização nasceu após a viralização de um vídeo gravado por mães brancas, falando a respeito da melhor forma de criar seus filhos. O discurso foi percebido como sem sentido para a realidade de mães pretas, o que levou à criação de um espaço para que essas mães pretas pudessem compartilhar suas experiências, fortalecendo a identidade e autoestima.

“É um espaço de cura, com estratégias para causar incômodo”, diz ela. E esse incômodo significa, em termos práticos, promover ideias diferenciadas, que saiam do senso comum de um mundo determinado pela visão branca. É por essa linha que Adriana destaca o projeto desenvolvido pela Associação, que é o “Quilombinho de verão”, através do qual é oferecido um conjunto de oficinas com referência africana.

Quilombinho de Verão é caracterizado como um projeto político-pedagógico que oferece uma imersão de crianças negras na cultura e ancestralidade africana durante as férias escolares. A ideia é ir além do ensino usual que, segundo Adriana, aponta basicamente para a ocidentalidade, ignorando as realidades e os conhecimentos oriundos do continente africano.

A integrante da Associação aproveitou a manifestação da professora Simone Alvarez e de Angela Souza para fazer um convite à reflexão. Para Adriana, é importante que as pessoas façam o “teste do pescoço”. A ideia é bem simples: estando em um espaço público, como por exemplo, em uma sala de aula, olhar para um lado, depois olhar para o outro. Se não enxergar pessoas negras é porque “tem alguma coisa errada”, ou seja, não há diversidade étnica.

Avaliação

Para a diretora da Sedufsm Neila Baldi, que participou da mesa 3, o seminário Feminicídios cotidianos “representou uma oportunidade ímpar de reunirmos as seções sindicais do Rio Grande do Sul e debatermos as violências pelas quais, nós, mulheres, passamos, em todas as instâncias”. Segundo ela, ficou evidente, durante o encontro, da necessidade de trazer estas temáticas à discussão para a construção de alternativas às políticas existentes ou aprofundá-las.

Na concepção de Neila, as três mesas mostraram que a implantação de uma política precisa de recursos humanos e financeiros e, portanto, de um papel mais ativo do Estado. “Mulheres que sofrem violências – e aqui não estávamos nos referindo à morte, mas todas as outras que ocorrem antes deste ato – precisam de acolhimento efetivo de suas demandas. Não é possível sofrermos qualquer violência e ainda termos de nos submeter a continuar convivendo com o agressor e as mesas mostraram que tanto nas mortes, quanto na violência de raça ou de gênero, como o assédio, a política não está sendo suficiente porque não temos garantias de o agressor ser afastado, de fato”.  Dessa forma, complementa ela, “precisamos repensar a atuação do Estado, para efetivar as políticas e, se necessário, criar outros instrumentos de combate às violências”.

Daniele Cunha, 1ª Vice-presidente da Regional RS do ANDES-SN, ressalta que o seminário foi muito importante para que se possa conhecer melhor a realidade do Rio Grande do Sul no que diz respeito à violência contra a mulher e também para que se entenda as diferentes formas de violências de gênero e de racismo. Segundo ela, muitas vezes são formas sutis, mas que estão presentes no cotidiano, tanto no ambiente de trabalho quanto em outros espaços, como nos movimentos sociais e sindicais, e nos locais de moradia.

A diretora da Regional também destaca a presença de diferentes gerações de militantes do ANDES-SN, que nos “permitiu ter um olhar para o percurso do debate contra as opressões desenvolvido ao longo dos anos no sindicato nacional, bem como para as políticas concretas que foram construídas a partir da luta das mulheres do sindicato, como a paridade na composição da diretoria nacional, as comissões de enfrentamento ao assédio formadas em nossos eventos, os espaços de convivência infantil em nossas atividades, o Protocolo de Combate, Prevenção, Enfrentamento e Apuração de assédio moral e sexual, racismo, lgbtfobia e qualquer discriminação e violência, a cartilha Combatendo os assédios Sexual, Moral e outras violências”.

Na compreensão de Daniele, foi uma atividade formativa muito enriquecedora, que gerou “desacomodações e reflexões sobre nossas práticas”. Sobre o futuro, comentou que diversas mulheres manifestaram o desejo de realizar outras edições do evento em 2026, de forma itinerante nas diferentes Seções Sindicais do RS. “Isso deve ser tratado em nossas próximas reuniões da Regional com as Seções Sindicais”, finaliza a professora.

Participantes

Participaram do seminário ocorrido em Porto Alegre: Adufpel, Aprofurg, Sedufsm, ANDES/UFRGS, SindoIF. O DCE do Instituto Federal foi representado por sua presidente, a estudante Sol Guilloux Mazzarolo, e a Federação Nacional de Estudantes do Ensino Técnico (Fenet) foi representada por sua diretora executiva, Kayênah Manicongo.

Durante o evento também houve um momento cultural com a apresentação de ‘Fuchsia’, uma artista que desenvolve o estilo “Slam”, um tipo de “batalha de poesia” que lembra bastante o hip-hop.

A Sedufsm esteve representada no evento pelas diretoras Neila Baldi, Belkis Bandeira, e pela docente da base da seção sindical, professora Maristela Souza, do Centro de Educação Física e Desportos.

 

Texto e fotos: Fritz R. Nunes
Assessoria de imprensa da Sedufsm

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