UFSM reconhece notórios saberes de comunidades tradicionais
Publicada em
13/11/25
Atualizada em
13/11/25 11h34m
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Resolução aprovada no Conselho Universitário tem apoio da Sedufsm
O Conselho Universitário (Consu) da UFSM aprovou na sexta-feira (31 de outubro) a resolução que estabelece o título de notório saber em artes, ofícios, cosmologias tradicionais e cultura popular. Com isso, representantes das culturas afro-brasileira, indígena e quilombola podem receber esse título, equivalente ao de doutor nas áreas de conhecimento ou afins nas quais a UFSM mantenha curso de doutorado. Isso dá aos detentores do título de notório saber a possibilidade de docência em disciplinas, minicursos e simpósios como professores visitantes.
Fernanda Ferreira, integrante do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros e Indígenas (Neabi) da UFSM e uma das construtoras do documento, avalia que “a aprovação da resolução, trazendo essas diferentes cosmologias para a universidade, permite que, para além das ações afirmativas, a gente tenha um outro movimento, que é a inclusão de cotas epistêmicas, pensando principalmente esses troncos que a gente não vê na universidade, que são os troncos indígenas, afro-brasileiros.”
O presidente da Sedufsm, professor Everton Picolotto, ressalta que a decisão do Consu é um importante marco para a valorização e o reconhecimento institucional dos notórios saberes, conhecimentos, artes e ofícios historicamente produzidos por grupos sociais marginalizados.
Na ótica de Picolotto, a concessão de títulos de notório saber não apenas dignifica e insere esses grupos na esfera acadêmica, mas também representa uma oportunidade estratégica para o enriquecimento do patrimônio cultural e intelectual da própria Universidade. “Ao incorporar esses profissionais e seus inestimáveis componentes de saber em seu rol de formação, a instituição eleva a qualidade e a relevância social de seu projeto educacional”, sublinha o docente.
Construção coletiva
O processo de reconhecimento dos notórios saberes dentro da UFSM começa com a tese de doutorado de Fernanda Ferreira. Elaborada dentro do Programa de Pós-Graduação em Extensão Rural, a tese intitula-se “A saúde popular comunitária e o Projeto Casa do Caminho: construindo a saúde integral com base em saberes ancestrais e decoloniais em comunidades rurais e de periferias urbanas da região sul do RS”. O trabalho foi orientado pelos professores Renato Santos de Souza e José Geraldo Wizniewsky. A tese se transformou em um projeto de extensão, intitulado “Notórios saberes: reconhecimento institucional e valorização dos saberes e fazeres para os(as) mestres(as) de saberes tradicionais”, que visa ao reconhecimento institucional de notórios saberes na UFSM.
O Neabi passou a integrar o grupo de trabalho criado para ampliar o debate iniciado pela tese e apresentar uma minuta de resolução para a Reitoria da UFSM. A minuta passou por apresentações em diferentes cursos, departamentos e instâncias técnicas, acadêmicas e administrativas, até a sua versão final, que foi aprovada no Conselho de Ensino de Pesquisa e Extensão (Cepe) e no Consu.
Universidade inclusiva
A aprovação da resolução, conforme Fernanda, aponta para o fortalecimento de uma universidade inclusiva, que trabalha diretamente com as diferentes realidades, fazendo uma educação voltada aos seus territórios, trabalhando com as diferentes comunidades, reconhecendo os diferentes saberes que esses mestres e mestras trazem, que ampliam, que se conectam com as suas comunidades, na perspectiva de diferentes culturas, de trazer todo um saber social, ancestral.
Na análise de Fernanda, a resolução representa esse processo de descolonização do saber, na busca de se construir e ampliar a pluridiversidade na academia, com epistemologias que ainda não são encontradas nas matrizes curriculares convencionais. “Ainda estamos muito baseados nos saberes clássicos e não os estamos excluindo, mas sim, ampliando essa discussão, para que a gente possa ser também representados nessas epistemologias, possibilitando o encontro do saber tradicional com o científico, estabelecendo esse diálogo”, diz ela.

Como vai funcionar o processo de solicitação do título de notório saber
Para receber o título de notório saber, a pessoa deve ter atuação comprovada há pelo menos 15 anos como mestre dos saberes e fazeres populares ou tradicionais. Essa atuação pode ser nas áreas de educação popular, pesquisa não acadêmica, preservação e representação dos conhecimentos tradicionais e como mestres nos ofícios e tradições. A competência na área de atuação e reconhecimento popular, tanto dentro quanto fora de suas comunidades e coletivos, também são requisitos para a titulação.
O processo de inscrição para solicitar o título ocorrerá por meio da publicação de um edital anual pela Pró-Reitoria de Pós-Graduação e Pesquisa. Além da comprovação do conhecimento e área de atuação, os candidatos devem enviar um dossiê com um memorial que apresente sua biografia e trajetória de atuação. A atuação deve ser comprovada por documentação escrita (como matérias jornalísticas, bibliografias e documentos pessoais), audiovisuais (como fotografias e mídias sonoras) e outros meios digitais de registro.
As solicitações serão analisadas por uma banca examinadora formada por cinco docentes doutores da área de conhecimento dos notórios saberes ou equivalentes. No mínimo, dois docentes serão externos à UFSM. O reconhecimento do título de notório saber em artes, ofícios, cosmologias tradicionais e cultura popular será discutida e aprovada pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão (Cepe).
Movimento nacional pela inclusão das diversas formas de conhecimento
A articulação pelo reconhecimento do notório saber é vinculado ao movimento Encontro de Saberes, iniciado em 2010 na Universidade de Brasília (UnB), com a proposta de descolonização do pensamento e práticas no meio acadêmico por meio do reconhecimento e da inclusão dos mestres e mestras dos saberes, fazeres e ofícios que fazem parte da cultura brasileira. Uma das reivindicações do movimento é a implementação de cotas epistêmicas, que buscam abrir espaço na docência para representantes das tradições culturais das comunidades negras e indígenas
Texto: Fritz R. Nunes com informações do site da UFSM
Foto: Arquivo
Assessoria de imprensa da Sedufsm
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