O lugar da UFSM na cidade de Santa Maria SVG: calendario Publicada em 01/06/2022 SVG: views 2600 Visualizações

“Pra quem chega de Rosário ao fim da tarde” é difícil avaliar o lugar que a UFSM ocupa em Santa Maria. Pra quem chega de Rosário, Pelotas ou Porto Alegre e vê Santa Maria pela primeira vez.

O primeiro verso do “Canto Alegretense”, de Neto Fagundes, serve bem para iniciar essa crônica a respeito do lugar da UFSM na cidade e indicar, com poesia, a importância que o assunto tem.

Quando aqui cheguei, vindo de Porto Alegre (em 1989), eu só sabia que Santa Maria fora um importante polo ferroviário do Estado, que a UFSM era uma das duas universidades federais do interior do Estado e que possuía peculiaridades a serem descobertas. Eu vinha para prestar concurso no Departamento de História (naquele tempo, chamado de Faculdade), e mal consegui tomar conhecimento da cidade.

Desembarquei num “fim de tarde” na rodoviária, então na Avenida Dores, e caminhei até o prédio de um amigo na Rua Duque de Caxias. No outro dia peguei o ônibus para o campus (na Astrogildo de Azevedo) e realizar a prova escrita (na Biblioteca Central). Gostei de cruzar a região de Camobi, naquele tempo ainda com ares de zona rural. Os prédios do campus estavam concentrados ao longo da Avenida Roraima e a população que transitava na área era majoritariamente branca.

Só a partir de 1991, quando voltei a Santa Maria e tomei posse como professor, a UFSM e a cidade foram se desvelando aos meus olhos. Hoje, com a perspectiva dos últimos 30 anos, constato que desapareceu a acanhada rodoviária, os ônibus do perímetro urbano mudaram para melhor, Camobi é um bairro extremamente urbanizado, os prédios do campus se espraiam para além da Avenida Roraima e a população que transita na área ganhou maior diversidade étnica.

A cidade e a universidade cresceram nesses anos e grande parte disso se deve ao dinheiro do Governo Federal – acrescentando-se que, para a cidade, também deve ser computado as verbas para os estabelecimentos do Exército e Aeronáutica. Nos anos 90, havia um movimento gaúcho separatista, com adeptos entre professores e alunos da universidade, e recordo de um amigo provocando os separatistas:

– Mas se rompermos com Brasília, Santa Maria vai retroceder, tchê! E, quanto a nós, perderemos nossos ricos empreguinhos.

O separatista demorava a encontrar argumento para rebater meu colega e a conversa invariavelmente morria.

De lá para cá, penso que a coisa não mudou, afinal só pela universidade entram mais de um bilhão de reais por mês (800 mil em salários) e não sei como a iniciativa privada local viveria sem isso. Certamente veríamos, de modo mais acentuado, o que estamos assistindo hoje, com a atual diminuição da renda da população mais os cortes de verbas para as universidades federais: vários empreendimentos fechando e outros mudando de perfil. O tema é instigante, mas me faltam dados para uma visão mais precisa.

Reduzo o foco, então, e concluo esse comentário lembrando os projetos de extensão da UFSM que acompanhei. Nas JAIs (Jornadas Acadêmicas Integradas) assisti aos relatos dos participantes desses projetos e confesso que me emocionei com os estudantes contando suas atividades em dois projetos especialmente: “Amigos do carroceiro” e um outro, visando a identificação e prevenção de animais peçonhentos, por meio de oficinas em escolas de Ensino Fundamental da periferia.

“Amigos do carroceiro” dirigia-se à saúde dos cavalos dos carroceiros da Vila Maringá e do bairro Alto da Boa Vista e recordo os dados apresentados a respeito das condições de saúde dos animais, devidamente tratados por estudantes do Curso de Veterinária, entusiasmados com a possibilidade de se inserir num mundo para além da sua realidade social. Eram fotos e registros tanto dos cavalos quanto dos carroceiros e seus familiares – alguns deles atendidos por estudantes do Curso de Odontologia.

O outro projeto era constituído de aulas para a meninada de escolas da periferia – “onde ainda há mato ao redor, professor”, me disse um aluno de Biologia ao perceber o meu espanto, “e onde a gurizada precisa conhecer bem as cobras venenosas”. Cobras que, de fato, os alunos aprendiam a identificar e a saber quais os cuidados a ser tomados, caso alguém fosse mordido.

Apresentações acadêmicas que sintetizam a Universidade que muitos de nós gostamos de destacar: a universidade que se faz presente para além dos seus muros e que se engrandece no contato com a população, prestando serviços. A universidade que se realimenta dessa relação com a realidade e aguça o olhar dos seus integrantes, professores e estudantes, para um aprofundamento do conhecimento. A Universidade que interage com a cidade e a torna alguma coisa melhor.