Mãe Terra: nossa casa ameaçada Publicada em 08/05/2024 638 Visualizações
"Precisamos urgentemente nos reconectar com a Mãe Terra, nossa casa maior. Nossa única casa."
Somos seres terrestres. Nossa existência depende integralmente da saúde do planeta. Mesmo diante de condição tão essencial, o homem negligencia os cuidados. É na falta que se valoriza o que tem! É importante dar um passo à frente à visão imediatista – refletir a importância e a essencialidade de cuidarmos da nossa casa maior, a Terra.
Dia 22 de abril é o Dia da Terra – data destinada à reflexão sobre a importância da preservação e da conservação do planeta. A harmonia requer reflexão e uma tomada de ação tanto da sociedade como dos governantes. Somos 8 bilhões de habitantes desafiando o equilíbrio e impactando drasticamente esse sistema vivo. O atendimento das necessidades humanas conduz a um consumo cada vez mais intenso, voraz e complexo. Os processos de manufatura jogam na atmosfera, nas águas e no solo milhares de toneladas diárias de resíduos. A quantidade cresce a cada ano. São mais e mais resíduos de todos os tipos descartados, muitos inadequadamente. A crença na capacidade infinita de absorção dos impactos está levando o planeta à exaustão, seja pela extração, seja pelo descarte, seja pelo sufocamento.
Nossas ações deixam rastros, legados às gerações futuras. O futuro não é tão distante como imaginável. As mudanças climáticas cada vez mais evidentes e intensas são a prova de que nossas ações destroem a harmonia e está sendo paga todos os dias, seja por enchentes, vendavais, tsunamis e tantos outros eventos extremos. Pragas até então controladas, ressurgem assolando populações com diversas doenças que pareciam extintas. A sensação é de que estamos vivendo um filme de ficção em que um cientista resolve remexer em flagelos do passado.
Poluição plástica
São milhões, bilhões de embalagens descartáveis consumidas todos os dias. A reciclagem alcança índices muito baixos para nos despreocuparmos com a questão. É só multiplicar nossas ações pelos habitantes do planeta que temos a clara dimensão da significância de nosso consumo. De acordo, com a ONU 46% dos plásticos no mundo são dispostos em aterros e 22% são depositados inadequadamente. Os mares é previsão, em 2050, conterão mais plásticos do que peixes. O fornecimento de alimentos e as atividades pesqueiras sofrem e, sofrerão ainda mais, efeitos significativos. Espécies correm riscos de extinção. Vivemos a “crise do plástico”, afirmam os especialistas. Consumir produtos recicláveis e retornáveis, separar resíduos e descartar corretamente diminui a carga creditada ao planeta e reduz a quantidade a ser absorvida por ele.
Os plásticos são materiais de difícil degradação. São centenas de anos para decompor uma embalagem. As gerações se sucedem e o plástico continua na superfície da Terra sofrendo uma lenta transformação. É um legado devastador às novas gerações que, antes de tomarem consciência sobre seu papel nesse planeta, já recebem a missão de gerenciar uma herança praticamente indissolúvel e infinita. É difícil imaginar a abolição dos plásticos da face da Terra. Porém, é possível reduzir. Reduzir o consumo, substituir por materiais alternativos deixando para as situações essenciais aquilo cuja falta não pode ser suprida.
A poluição por plásticos virou uma questão de saúde planetária, afirma a jornalista Silvia Marcuzzo da Plataforma SLER. Até o dia 29 de abril, em Ottawa (Canadá), ocorreu mais uma rodada de negociações do Tratado Global contra a Poluição Plástica. O documento chamado Manifesto, preparado por ambientalistas, cientistas e representantes de diversas organizações, já consta com a pactuação de 80 organizações da sociedade. Ele chama a atenção aos diversos aspectos da poluição provocada pelos plásticos. O acordo visa atingir basicamente o uso desnecessário, os de uso único e de curto ciclo de vida, pois se transformam em lixo muito rapidamente. Estes materiais impactam o meio ambiente, a segurança alimentar, a economia e agravam a crise climática. A ONU está preocupada com esse tema. Os riscos à saúde humana ficam cada dia mais comprovados e evidentes. Os microplásticos estão aí circulando por todos os lugares, inclusive na nossa corrente sanguínea.
Riscos à atmosfera e ao clima
O Secretário Executivo da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas advertiu a comunidade mundial, dia 10 de abril, que temos dois anos para salvar a humanidade. O alerta foi direcionado à falta de ações efetivas para combate à emissão de gases poluentes. São as populações mais vulneráveis que pagam a conta mais alta desses desmandos e inércia.
O petróleo move o mundo. É difícil imaginar um mundo sem petróleo, apesar do crescimento e das novas alternativas energéticas. Os grandes produtores e os grandes consumidores continuam incentivando as explorações, a produção e o consumo. O aumento da temperatura do planeta é um dos sinais mais evidentes do efeito dos gases provenientes dos combustíveis fósseis. Dentre as inúmeras repercussões, o preço dos alimentos tende a aumentar, enquanto a oferta se move em sentido contrário, diminui. O agravamento da fome no mundo é um dos sinais mais evidentes da crise climática. A fome é uma realidade que assola diversas comunidades, planeta a fora. Eliminar o petróleo e outros combustíveis fósseis é mais do que uma questão de sustentabilidade. É sobrevivência da espécie humana! O planeta se adapta como se adaptou à extinção dos dinossauros.
O sistema de desenvolvimento hoje imposto pressupõe um crescimento sem limites. Esse modelo é incompatível com a saúde do planeta e com as limitações inerentes ao um sistema vivo, como a Terra. Não há planeta B! Ao menos para as próximas gerações, é ilusório imaginar que a vida humana possa ser transportada para outros mundos.
Ameaças às águas e ao solo
As águas são essenciais para as atividades humanas, da recreação à alimentação e, à produção. Não há vida sem água. Populações inteiras enfrentam a escassez seja pelo aspecto qualitativo ou quantitativo. Em algumas situações, a água existe, porém as condições estão tão deterioradas que, mesmo com tratamentos complexos e caros, continua inviável. Não raras vezes, é a falta ocasionada pelas secas e estiagem que atinge as populações. Novamente, são os mais vulneráveis os principais atingidos pela escassez.
O desmatamento e a erosão contribuem, não apenas para a exaustão do solo, mas para o déficit hídrico. No dia 9 de abril, o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, sancionou o Projeto de Lei 151/2023 que flexibiliza o Código Estadual do Meio Ambiente para a construção de barragens e açudes em áreas de preservação permanente, APP. O objetivo do projeto é proporcionar alternativas de armazenamento de água para a agricultura e à pecuária para enfrentar os períodos de estiagem. Ambientalistas alertam para o conflito com a legislação federal que trata sobre essas áreas e trará questionamentos à justiça. A queda de braço é antiga e vai ao encontro dos interesses ruralistas em relação à irrigação e à intervenção em áreas de APP. Mais do que a permissão, os produtores deveriam preservar nascentes, recompor a mata ciliar, conter a erosão e eliminar o desmatamento.
A Lei 12651/2012, Código Florestal Brasileiro, define que área de preservação permanente (APP) é uma área protegida, coberta ou não por vegetação nativa. A função ambiental dessas áreas é preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade. Também têm a função de facilitar o fluxo gênico da fauna e da flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. A definição guarda a obviedade de proteção, sobretudo aos recursos hídricos. Liberar intervenções para construir barragens é um contrassenso, além de demonstrar a prevalência da pressão humana sobre a preservação ambiental. A catástrofe vivenciada em nosso estado no final do mês de abril e início de maio é o sinal claro da destruição das bordas dos morros e dos rios que ficam sem contenção e extravasam alagando imensas extensões de terra, em um fenômeno jamais presenciado. O que aconteceu no RS não é um desastre natural é a consequência da invasão humana e dos desmandos sobre os ambientes naturais.
Reconexão à Mãe Terra
“A civilização que estamos construindo, suprimindo tudo aquilo que constituía o contexto de nossa vida até hoje, é talvez, um impasse: talvez conduza a nada, exceto, à ruína da humanidade.
A natureza selvagem não serve para nada, dizem os tecnocratas atuais. Mais do que isso, prejudica-nos, pois toma o lugar das nossas culturas, abriga parasitas, e impede-nos de fazer com que reine em toda a parte a lei do homem, baseada na rentabilidade comercial.”
O trecho que destaco é do livro “Antes que a Natureza Morra” (Jean Dorst), cuja primeira impressão, em português, ocorreu em 1973. Apesar de terem se passados mais de cinquenta anos, as palavras soam atuais e com tom de concretização das previsões dos equívocos humanos que promovem gradual e crescente disruptura com a natureza. Previsões que se consolidam como profecias de extinção. Somos natureza e esquecemos essa conexão ao subjugá-la, dominá-la e ao destruí-la. Não podemos nos desligar da natureza. Somos total e completamente ligados, umbilicalmente, a ela. Somos água, solo, ar, mar, terra, rio, pássaro, peixe e universo. Precisamos urgentemente nos reconectar com a Mãe Terra, nossa casa maior. Nossa única casa. A Terra é um oásis no universo. É um lugar que abriga diversas formas de vida. É um lugar de vida! Vida em harmonia.
Sobre o(a) autor(a)
Por Marta TocchettoDoutora em Engenharia. Professora aposentada do departamento de Química da UFSM