O fantasma da inflação volta a assombrar SVG: calendario Publicada em 06/10/2021 SVG: views 344 Visualizações

O Plano Real (lançado no governo Itamar Franco) foi o mais bem sucedido plano de estabilização da história do país. A inflação que se aproximava de 50%, em junho de 1994, caiu para cerca de 0,5%, em dezembro do mesmo ano. Isso se transformou em capital político que permitiu ao então Ministro da Fazenda da época, Fernando Henrique Cardoso (FHC), lançar-se como candidato (que saiu vencedor) a Presidente da República.

Fato é que, desde o governo FHC, ninguém se arriscou a perder o capital político da estabilização. Nem Lula pareceu disposto a correr o risco da volta da inflação. Tanto é que o seu primeiro mandato, em termos de política econômica, é muito parecido com o de FHC. Preferiu manter o sistema de metas de inflação do governo anterior ao invés de optar pelo maior crescimento econômico. Motivo, inclusive, de desgaste junto as suas próprias bases eleitorais. Lula só “destravou” a economia no segundo mandato, após a obtenção de sucessivos superávits fiscais.

Depois do mais longo período de estabilidade da história da República (25 anos), a dupla Bolsonaro/Guedes pode colocar tudo a perder. Chegamos ao temido patamar da inflação de dois dígitos (10,05% em12 meses), segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), que é uma prévia da inflação oficial do país, que se acelerou de 0,89% em agosto para 1,14% em setembro. Para o IBGE, "trata-se do maior resultado para o mês de setembro desde o início do Plano Real, em 1994, quando ficou em 1,63%", além de ser a maior taxa da série histórica do indicador desde fevereiro de 2016, quando ficou em 1,42%.

Quem são os vilões da inflação? De acordo com o IBGE, a gasolina e a energia elétrica foram os itens que exerceram os maiores impactos individuais sobre o IPCA-15 de setembro, de 0,17 ponto percentual cada. O preço médio da gasolina subiu 2,85% entre agosto e setembro e acumulou alta de 33,37% no ano e de 39,05% nos últimos 12 meses. Já o preço médio da energia elétrica teve alta de 3,61% em setembro. No ano, a alta acumulada foi de 20,27%, enquanto nos últimos 12 meses o aumento acumulado foi de 25,26%.

Pode ser que você seja daqueles que odeia quando os economistas começam a falar de números – fica logo com dor de cabeça! Não lhe tiro a razão. Mas, no caso da inflação, você acaba sentindo no próprio bolso e não pode simplesmente fingir que o problema não lhe afeta.

Você certamente já ouviu falar que a inflação é um imposto que pune mais os pobres do que os ricos e achou que isso era discurso da esquerda. Talvez, tenha ficado intrigado com as frequentes matérias do Jornal Nacional (JN) sobre o assunto, mas achou que esse era mais um capítulo da “guerra” Bolsonaro/Rede Globo. Pode ser inclusive que você nem seja de direita, nem eleitor de Bolsonaro e nem antipetista. Você simplesmente é um cético e acha que essa briga não lhe diz respeito. Mas você está enganado.

Se você ganha pouco, por exemplo, o peso da alimentação é proporcionalmente alto no seu orçamento, mas não para os ricos cujo peso dos alimentos, em relação à renda, é pequeno. Como isso acontece? Simples. Vamos dar um exemplo para demonstrar que você tem a sua inflação particular.

A “sua inflação” é calculada a partir de sua cesta de consumo. Imagine que você é um maníaco por organização, que ganha um salário-mínimo e gasta toda a sua renda com alimentação (deixando de lado outras despesas, para facilitar). No final do mês, junta as notas do supermercado e soma o quanto gastou com cada produto. A seguir, atribui pesos relativos a cada um (quanto maior o gasto, maior o peso). Pronto, você já tem o próprio índice de inflação.

No mês seguinte, você mantém os pesos do mês anterior e anota, numa planilha, os novos preços. Depois, basta dividir o índice do mês atual pelo do mês anterior para encontrar a variação (sua taxa de inflação). Claro, o exemplo é apenas didático. O cálculo dos índices oficiais de inflação (como o IPCA) é mais complexo, baseia-se numa amostra de orçamentos familiares, estatísticas e cálculo matemático. Mas a mecânica é essa.

Agora que você aprendeu a calcular a sua própria taxa de inflação, ainda continua achando que a economia não tem nada a ver com a vida real?

Sobre o(a) autor(a)

SVG: autor Por José Maria Pereira
Doutor em Economia, professor aposentado do departamento de Economia e Relações Internacionais da UFSM e também da UFN

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